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CONTRIBUIÇÕES DA GESTALT-TERAPIA PARA O FORTALECIMENTO DA CAPACIDADE DE RESILIÊNCIA DO SUJEITO.
INTRODUÇÃO
Este artigo, tem como objetivo aprofundar a história e os conceitos sobre resiliência e o fortalecimento do sujeito, baseado nos termos da Gestalt-terapia e conceitos para explicar a resiliência, dentro das condições adequadas do processo de vida do sujeito.
Dentre os precursores da história, pode ser ressaltar, “os grandes resilientes foram justamente aqueles homens e mulheres que se propuseram mudar a sociedade e a cultura em que viviam, assumindo em si mesmos a tarefa de plasmar na sociedade seus próprios valores e ambições de transformação.” O sujeito resiliente é um sujeito crítico de sua situação existencial. Galende (2004, p.60). Baseado nos fatos acima, destaco Viktor Frankl que mostrou com a sua experiência de vida no campo de concentração, que tendo sentido de vida o ser humano pode mudar todo contexto histórico e social ao qual se encontra inserido. “O ser humano, em última análise, se determina a si mesmo. Aquilo que ele se torna dentro dos limites dos seus dons e do meio ambiente é ele que faz de si mesmo". Frankl (2006, pp.113).
Resiliência é um conceito originário da física, ciência na qual este constructo é definido como a capacidade de um material absorver energia sem sofrer deformação plástica. Em psicologia este conceito está superado, pois, uma pessoa não pode absorver um evento estressor e voltar à forma anterior. Ela aprende, cresce, desenvolve e amadurece. No entanto, resiliência não denota resistência absoluta a qualquer adversidade; pelo contrário, pode implicar enfrentamento (ANTHONY & COHLER, 1987; MASTEN & GARMEZY,1985).
O conceito de resiliência, aplicado às ciências da saúde, particularmente no campo da psicologia, foi compreendido e definido sob diferentes prismas ao longo dos últimos 30 anos. Encontramos entre suas diversas definições a existência de traços de personalidade individuais especiais, a capacidade de recuperação de traumas, a capacidade de superação de obstáculos, um conjunto de habilidades e competências individuais, invulnerabilidade, o resultado do equilíbrio entre fatores de risco e fatores de proteção e resultados do enfrentamento de situações de estresse, entre outros. Souza (2003, 2004); Souza e Cerveny (2006a e 2006b). Rutter (1999) pondera que resiliência não é uma característica ou traço individual, mas processos psicológicos que devem ser cuidadosamente examinados.
Resiliência não é uma característica fixa, ou um produto; pode ser desencadeada e desaparecer em determinados momentos da vida, bem como estar presente em algumas áreas e ausente em outras. Neste sentido, a resiliência é entendida, portanto, não somente como uma característica da pessoa, como uma capacidade inata, herdada por alguns “privilegiados”, mas a partir da interação dinâmica existente entre as características individuais e a complexidade do contexto ecológico. Cecconello, (2003); P.A. Cowan, C.P. Cowan & Schulz, (1996); Junqueira & Deslandes ( 2003); Seligman & Csikszentmihalyi (2000); Yunes( 2003); Yunes & Szymansky, (2001).
Porém, a Gestalt-terapia não está interessada em questionamentos sobre como o desenvolvimento do paciente onde pode ter sido interrompido na sua infância, mas sobretudo preza por ajudá-lo a perceber e trabalhar suas ansiedades e bloqueios atuais, talvez melhor denominados distúrbios de contato do que resistências, que impedem que aconteça o próximo ato iminente de crescimento. FROM; MILLER( 1997, p.26).
A Gestalt-terapia contribui no fortalecimento do sujeito através da teoria e técnica vivencial, que permite o indivíduo vivenciar o seu momento, através dos sentidos em toda a sua plenitude, corpo e mente, sem resistir, mas viver, sem cristalizar, mais sair do casulo ou esconderijo, para fechar o ciclo através das asas da transformação. Por isso a investigação é no intuito de estabelecer a conexão de “quem eu sou”, sem máscaras, mas com o melhor que cada um pode extrair de si.
Resiliência é se permitir viver, no estado que a pessoa se encontra com dor, angustia ou outro tipo de sintoma, sentindo e transformando esse sofrimento em um diferencial de superação e aprendizado. É transcender, sem deixar de pensar, sentir e agir.
O presente artigo busca proporcionar a reflexão e apresentar as possíveis contribuições da Gestalt-terapia para o enfrentamento e fortalecimento da capacidade de resiliência do sujeito. Nesse sentido, justifica-se pela necessidade de construir uma literatura científica, visto que, não se encontra na literatura relações explícitas entre Gestalt-terapia e Resiliência, auxiliando assim no desenvolvimento de intervenções que auxiliem no fortalecimento do ser humano a prosseguir mediante conflitos, traumas e sofrimentos em meio às adversidades da vida.
Diante do exposto, o objetivo geral deste artigo consiste em avaliar qual a contribuição da Gestalt-terapia no enfrentamento de riscos e fortalecimento/desenvolvimento da capacidade de resiliência do sujeito. E os objetivos específicos são: explanar acerca de fatores de risco e proteção conhecidos na literatura específica da resiliência; compreender os conceitos da Gestalt-terapia que podem auxiliar no fortalecimento /desenvolvimento da capacidade de resiliência do sujeito e; conhecer como fortalecimento/desenvolvimento da capacidade de resiliência ocorre através da Gestalt-terapia.
METODOLOGIA
O referencial metodológico abordado nesse artigo constitui de uma “revisão de literatura, que se caracteriza por suprimir dúvidas a partir de pesquisas em documentos. Isso implica no esclarecimento das pressuposições teóricas que fundamentam a pesquisa e das contribuições proporcionadas por estudos já realizados com uma discussão crítica (GIL, 2010). Sendo o material baseado em livros, artigos e textos dos principais autores, com objetivo de entender os conceitos e as contribuições da Gestalt-terapia para o fortalecimento da capacidade de resiliência do sujeito.
A pesquisa utilizada foi qualitativa, sendo um método de investigação que mostra de forma subjetiva as particularidades e experiências individuais, com intuito de aprofundar o conhecimento sobre o tema em destaque.
O levantamento de dados ocorreu no período de abril a junho de 2018 e utilizou-se para pesquisa as bases de dados SCIELO, BVS psi e revista online relacionados aos conceitos de Gestalt-terapia e resiliência.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Fatores de riscos e proteção conhecidos na literatura específica da resiliência
Os fatores de riscos estão relacionados a presença de eventos negativos, que se tornam maiores à medida que as consequências se mostram perigosas e podem apresentar problema bio-psico-emocional. Com isso podemos dizer que o conceito de risco psíquico, não pode conter uma definição fechada, absoluta, podendo ele variar na história de vida de uma pessoa, dependendo das circunstâncias e de diferentes fatores internos ou externos, apresentando consequências e repercussões diferentes para cada sujeito estudado.
Os fatores de proteção podem ser definidos como características individuais ou condições ambientais que diminuem a probabilidade de um resultado negativo ou indesejado ocorrer na presença de um fator de risco, reduzindo a sua incidência e severidade. Aisenberg & Herrenkohl, (2008).
Alguns fatores de proteção são fundamentais ao desenvolvimento, segundo Masten e Garmezy (1985): a) atributos deposicionais das pessoas, tais como autonomia, autoestima, bem-estar subjetivo e orientação social positiva, além de competência emocional, representação mental de afeto positivo e inteligência. Cecconello ( 2003). O fator de risco é baseado na frequência de ações negativas, com o conceito de resiliência é geralmente relacionado a respostas positivas. Essa associação intensificou os estudos sobre resiliência por se ter verificado que alguns sujeitos, diante da presença de fatores de risco, obtiveram resultados positivos ou até melhores do que aqueles alcançados em sua ausência (Cowan, Cowan & Schulz,1996 apud yunes & Szymanski, 2001).
As pesquisas sobre resiliência têm procurado identificar as possíveis formas de enfrentamento de situações de riscos, sem ficar presas às noções diretas ou desconsiderar mecanismos de mediação, ou moderação presente em toda a experiência de vida.
O resultado dos fatores de riscos e proteção acerca do conceito de resiliência é baseado nos diferentes mecanismos entre a pessoa e o ambiente e se dá nas percepções, proteções e reações em cadeias das situações vividas em cada momento de vida.
CONCEITOS DA GESTALT-TERAPIA
A Gestalt-terapia é a terapia de contato, que tem como finalidade alcançar awareness em todo o seu contexto e encontro pleno. “Está centrada no conceito contato e na natureza das relações de contato da pessoa consigo mesma e com o mundo exterior”. Ribeiro (1998, p.15).
Nesse sentido, awareness é uma forma de experiência que pode ser definida como estar em contato com a própria existência, como aquilo que é. Awareness total é o processo de estar em contato vigilante com os eventos mais importantes do campo indivíduo/ambiente, com total apoio sensório-motor, emocional, cognitivo e energético. O contato com awareness geram totalidades significativas novas é, portanto, é em si a integração de um problema. Yontef (1998 , p. 30-31).
A relação entre o terapeuta e o cliente é o aspecto mais importante da psicoterapia. O diálogo existencial é uma parte essencial da metodologia da Gestalt-terapia, e é uma manifestação da perspectiva de relacionamento. O relacionamento origina-se do contato. Por meio dele as pessoas crescem e formam identidades.
O relacionamento terapêutico em Gestalt-terapia enfatiza em quatro características de diálogo: 1) Inclusão que é o posicionar-se, tanto quanto possível, na experiência do outro, sem julgar, analisar ou interpretar, e simultaneamente resguardar o sentido de sua própria presença distinta; 2) Presença que consiste na expressão do Gestalt-terapeuta para o paciente. Em geral, criteriosamente e com discriminação, ele expressa observações, preferências, sentimentos, experiência pessoal e pensamentos; 3) Compromisso com o diálogo que envolve o contato como algo que acontece entre as pessoas, e nasce na interação entre elas. O Gestalt-terapeuta rende-se a este processo interpessoal, e por fim, 4) o diálogo é vivido, é algo feito, em vez de algo falado a respeito. Yontef (1998 , p. 18-19).
A Gestalt-terapia percebe as pessoas como seres de relação, e esta relação acontece através do contato. Ribeiro, (1994).
COMO O FORTALECIMENTO/DESENVOLVIMENTO DA CAPACIDADE DE RESILIÊNCIA OCORRE ATRAVÉS DA GESTALT-TERAPIA?
O fortalecimento/desenvolvimento da mudança ocorre no processo de resiliência do sujeito, quando o indivíduo percebe novas formas de ver o mundo ao seu redor, sem paralisar, mas prosseguir no caminho de várias possibilidades, apoiadas no conhecimento empírico, criatividade do ser humano, crescimento e restruturação para uma vida melhor. Segundo
Assentado na capacidade de enfrentar, acrescentar e fazer diferente através das experiências que possibilitam vivenciar e olhar o lado bom e prazeroso da vida. Isso requer não apenas autoconhecimento, mas um conhecimento direto da situação atual e de como o self está nesta situação. Qualquer negação da situação e suas exigências das vontades da pessoa ou da resposta escolhida é uma perturbação da awareness. Uma awareness significativa é a do self no mundo, em diálogo com o mundo e com a awareness do outro - não é uma introspecção com o foco interior.
A awareness é acompanhada por aceitação, isto é, o processo de conhecimento do controle, escolha e responsabilidade dos próprios sentimentos e comportamentos. Sem isso, a pessoa pode estar atenta à experiência e ao espaço vital, mas não para o poder que ela tem ou não tem”. Yontef (1998, p. 31)
As fantasias e os medos que se originam dos possíveis resultados de mudanças, podem bloquear, porém o risco está intrínseco ao ato de viver. Assim, entende-se por que, para a Gestalt-terapia é mais importante experimentar, do que falar sobre ou interpretar.
“Uma dicotomia é uma divisão na qual o campo não é considerado um todo, diferenciado, em partes diferentes e interconectastes, mas como uma diversidade de forças não relacionadas (e/ou) competidoras. O pensamento dicotomizado interfere na auto regulação do organismo, tende a ser intolerante para com a diversidade entre as pessoas e para com as verdades paradoxais a respeito de uma única pessoa”. Sendo assim, “a auto regulação organísmica leva a integração das partes umas com as outras, numa totalidade que contém as partes. Yontef (1998 , p. 34-35).
O campo é frequentemente diferenciado em polaridades: partes que são opostas, que se complementam ou explicam. Os polos positivo e negativo de um campo elétrico são o modo típico desta diferenciação, à maneira da teoria de campo. O conceito de polaridades considera os opostos como parte de um todo, como yin e yang”. Yontef (1998 , p. 34-35).
Fazendo uma conexão entre as polaridades risco e proteção, com significados opostos de perigo ou ameaça e acolhimento (proteção) onde percebe-se a contribuição da Gesltalt-terapia no fortalecimento do sujeito, tendo como objetivo o alcance da consciência plena.
Mendonça (1997, p. 6) afirma, que “a auto regulação é a tendência natural e inata do organismo de se reequilibrar, quando o seu equilíbrio biológico ou psíquico é interrompido”.
Por isso, este artigo proporciona abertura para encontrar auto regulação e “ajustamento criativo é uma forma saudável”, com que a pessoa interage no mundo e a melhora do ser humano em alcançar a resiliência e a plenitude de vida. Joseph Zinker (2007, p. 16).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Observa-se que o conteúdo teórico vivencial que foi adquirido ao longo da pós graduação, contribuiu de uma forma importante e muito relevante para crescimento profissional na atuação clínica dos discentes. Os objetivos alcançados para formação, foi de extrema importância e de um valor relevante, visto que, proporcionou um conhecimento e um olhar em perceber de uma forma diferenciada a dor e as dificuldades que outro tem em superá-las.
Através da análise de literatura verificada, percebeu-se informação generalizada e sem chegar a um consenso claro entre os autores sobre o conceito de resiliência e na abordagem Gestáltica não foi constatada, e sim, outras definições dos assuntos relacionados ao contexto inserido.
Outro aspecto examinado, foi a falta de estudo experimental e vivencial, apenas correlacional com o termo resiliência. Por isso foi respondido as perguntas, baseadas nos conceitos teórico e vivencial da Gesltat-terapia, fazendo correlação com o assunto resiliência.
Patricia Fulli
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